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28 de janeiro de 2010

Coluna das Mulheres

Ainda estamos em Janeiro de 2010 e parece cedo falar em Dia das Mulheres, afinal de contas ele só acontece no dia 08 de março. Será mesmo?

O texto a seguir fala da comemoração fajuta deste dia e da necessidade de um dia comemorá-lo sem precisar voltar às questões do passado mostrando por A+B que merecemos os direitos conquistados. Vale a pena a leitura!

Na semana que vem o assunto da coluna das Mulheres será “Casamento, Separação e Divórcio”. Até lá!

Diferença com data para acabar

Imagine comemorar o Dia Internacional da Mulher sem precisar falar do que aconteceu, festejando a data só como marco de um movimento que atingiu todos os objetivos, incentivou a satisfação pessoal e o sucesso econômico das nações, possibilitou o uso do potencial humano sem barreiras entre os sexos e fez homens e mulheres de todo o planeta comungarem dos mesmos direitos e responsabilidades. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), isso acontecerá, com certeza… mas vai levar tempo.

A ONU acredita que se as conquistas continuarem na velocidade atual – e ela não é pequena –, só em 2490 as disparidades de gênero desaparecerão completamente do mundo. Já é possível prever quais países chegarão na frente. Os nórdicos – Suécia, Finlândia, Islândia, Noruega e Dinamarca –, com certeza. Assim como Alemanha, Filipinas, Nova Zelândia, Reino Unido e Irlanda. Segundo o Global Gender Gap Report, ranking divulgado em novembro de 2006 pelo Fórum Econômico Mundial que traz as nações mais e menos igualitárias em termos de gênero, são esses os dez países que mais avançaram rumo à igualdade. O levantamento envolveu 115 nações que abrigam 90% da população mundial. Levou-se em conta quatro indicadores: educação, saúde, oportunidade econômica e profissional e participação no quadro político do País.

Posição medíocre – O ranking mundial mostrou que já foram erradicadas do mundo 90% das disparidades no que se refere a educação e saúde. Entretanto, nenhum país possui igualdade total dentro de seu território. Os pontos mais vulneráveis continuam a ser a oportunidade profissional e econômica e a participação no quadro político. Mesmo na Suécia, país que lidera o ranking e é modelo no assunto, uma mulher recebe 71% do salário de um colega na mesma posição. E os Estados Unidos, por sua vez, ficaram na 22ª posição, porque só 15% dos cargos parlamentares, ministeriais e de chefes de Estado estavam na mão de mulheres em 2005.

O desempenho do Brasil não foi o pior, muito menos o melhor. Ficou na mediana (67ª posição). Média que poderia subir se fossem derrubados três obstáculos desafiadores: o abismo salarial entre os dois sexos, os poucos cargos políticos ocupados por mulheres e a desigualdade no acesso à educação. As mulheres ocupam a maioria dos bancos das universidades (57,4%) e estudam mais que os homens, mas, em termos proporcionais, ingressam menos que no ensino fundamental. Quanto à participação no governo, basta dizer que nunca foi superada a média de 12% da presença de mulheres no Legislativo – apesar de mais da metade da população ser do sexo feminino.

Conquistas nas leis – “Temos que ver também o aspecto positivo. O movimento das mulheres pela igualdade obteve conquistas numa velocidade impressionante, sem parâmetros na história”, comenta Flavia Piovesan, professora-doutora na área de Direitos Humanos e membro do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem). “As mudanças podem ser lentas, mas elas são constantes.”

No Brasil, o primeiro marco foi o ano de 1932, quando foi estendido à mulher o direito ao voto. Em 1988, veio a maior das conquistas: a Constituição Federal, que consagrou, pela primeira vez na história do País, a igualdade de gênero como direito fundamental. Em 2002, o Novo Código Civil consolidou as mudanças constitucionais. Além disso, o governo brasileiro, em 1994, retirou todas as ressalvas que havia feito ao ratificar a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, em 1979. Ao menos no aspecto legal, nada, absolutamente nada, poderia obstruir a igualdade de gênero no Brasil. Então, o que tem impedido que ela aconteça na prática?

Mais oportunidades – Se o ranking dependesse apenas do quesito saúde, o Brasil levaria o primeiro prêmio, junto com mais 33 países. E se fossem levadas em conta apenas oportunidades econômicas e profissionais, estaria na 63ª posição. Pior ainda se o quesito avaliado fosse cargos no governo: 86ª posição. “A igualdade é lei, mas a mudança cultural exige um tempo muito maior para acontecer”, comenta Flavia. “No ambiente público a democratização tem andado a passos largos, mas falta a mudanças de mentalidade mais profunda na esfera privada e familiar. Os papéis masculinos e femininos precisam ser radicalmente redefinidos, e isso inclui, por exemplo, a divisão, de fato, dos cuidados com a casa e a família.” Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 91,3% das brasileiras que trabalham fora fazem serviços domésticos quando estão em casa. Entre os homens, a cifra cai para 42,6%.

Mercado de trabalho – Mesmo com mais educação e menos filhos, a brasileira continua a ganhar, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), uma média de 33% do salário do brasileiro. E há indícios de que o abismo aumenta nos cargos mais altos. “Essa diferença diminui à medida que a participação feminina cresce no mercado de trabalho. Só nos últimos 12 anos, ela passou de 42 para 48%”, assinala o economista Paulo Tafner, pesquisador do Ipea e coordenador do projeto Brasil: o estado de uma nação, que produz, anualmente, uma edição com o retrato do País em vários setores. “As empresas estão percebendo e quantificando mais precisamente a produtividade feminina. Por outro lado, a mulher está mais treinada, tanto em habilidades técnicas quanto em gerenciais e de comando.”

Isso poderá derrubar mais rapidamente o teto de vidro, barreira cultural que muitas vezes impede a ascensão feminina a altos cargos nas empresas e no governo, especialmente em áreas não relacionadas à saúde, educação ou assistência social, campos tradicionalmente reservados às mulheres. E assim as brasileiras, quem sabe, nem precisem aguardar até 2490 para comemorar a conquista da igualdade total e irrestrita. Na prática.

* Texto de Miriam Scavone originalmente publicado na Revista Bovespa

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